Esse é o relato daquele momento. O começo de qualquer trabalho é sempre intenso, mas desde o início eu percebi que esse voluntariado seria muito recompensador. Trabalho é trabalho, se fosse legal teria outro nome, já diriam tantas outras pessoas… Mas se a gente tá na chuva, é pra se molhar, né? Apesar da canseira dos treinamentos, a gente estava bem ansioso pra ver como seria o trabalho por aqui.
Na segunda, a maioria só começou a trabalhar a tarde, porque de manhã não tinha ninguém no campus. Foi feriado nacional e os alunos que moram aqui só chegaram a tarde.
Fui pra minha casa comer e encontrei um dos voluntários já lá, e o Junior. É bom ter outro brasileiro na casa, qualquer um que já foi morar fora sabe como é, a gente se entende. Ele nos passou um pouco do perfil de cada aluno. Claro que a gente não memorizou metade, mas já dava pra sentir como seria. A teoria as vezes parece bem assustadora.
Tô começando a achar que essa coisa de pontualidade britânica é uma balela. As famílias só começaram a chegar quase 2h depois do horário de check in. Mas tudo bem, esse foi só o dia de chegar na casa, não tinha nenhuma atividade.
Ver os alunos e os pais chegando começou a tornar toda essa jornada mais real. Agora é tangível. A maioria dos pais queria falar com a coordenadora, então fiquei por perto pra ouvir o que eles contavam sobre os filhos. Alguns já moravam na casa antes, outros vieram de outras casas, outros de outras escolas. No total são uns 9 alunos dormindo na casa durante a semana e 5 ficam pro final de semana também.
A coordenadora me pediu pra acompanhar a família do A., que tem Prader Willis, a se acomodar. Fizemos o check list das roupas e eles contaram um pouco da rotina do garoto. Parece ser bem tranquilo, apesar de demorar para entender as coisas e gostar muito de comida. Do tipo que não sabe a hora de parar. Os pais foram bem simpáticos e animados, gostei deles =).
Aparentemente A. não tem problemas de se despedir dos pais, pois não pareceu apresentar nenhum comportamento difícil a noite. Ele é bonzinho e geralmente obedece o que se pede dele. Do tipo que tentei dar uma volta com ele pelo campus, mas não fomos muito longe, haha!
Com a maioria deles temos que lembra-los de tomar líquidos e ir no banheiro, mas o A. ao menos é bem independente nessa hora. Não foi difícil perceber que ele queria ir no banheiro, talvez ele pudesse ter ido sozinho até algum deles na casa se ele soubesse onde eles ficam ;).
A hora da refeição é um momento particular. Eles fazem uma oração (sem religião) e um agradecimento e ai uma pessoa de cada mesa serve os demais. É meio estranho, mas por enquanto ainda não tive nenhum problema.
Como eu tinha lido no perfil do A., temos que tomar cuidado com sua alimentação. Não só por causa da compulsão, mas porque ele já colocou um suporte de titânio na coluna e não pode ficar gordinho. Por sorte, a refeição do dia era salada com frango, então dei bastante salada pra ele, hehe... Eu não reclamei porque salada com proteína animal também é a minha dieta.
Depois foi banho, escovar os dentes e dormir. No banho tive que pedir ajuda, porque no perfil dizia que A. fazia tudo sozinho, mas a realidade não foi bem essa. Ele já estava cansado e estava demorando muito para fazer os passos e o Junior veio me ajudar mostrando como que dava banho nesses casos. Ainda é meio estranho, mas é como dar banho numa criança. Grande.
Depois do banho, os alunos tem que levar suas roupas e sua toalha para a lavanderia, voltar para escovar os dentes e alguns vão direto dormir, outros podem usar computador, ouvir música, etc. A. foi direto pra cama. Essa parte foi muito fácil, porque ele geralmente obedece o que é pedido, então ele deitou, se cobriu e ficou quietinho. Ah, se toda criança fosse boazinha assim!
Depois disso, no fim do dia, temos que registrar todas as atividades dos alunos num caderno, para acompanhamento. Como se comportaram, se comeram bem, se fizeram as atividades, se pareciam satisfeitos com seu dia, etc. Nesse primeiro dia, foi bem fácil.
Ainda assim, primeiros dias são bem cansativos, e eu dei graças a deus de ter folga no dia seguinte!
Como residente temporária (ou sei lá que nome eles dão aqui), tenho que me registrar na polícia, para eles saberem do meu paradeiro. Então uma das deputies me levou para Bournemouth para essa burocracia. O registro tem um custo, mas o camp hill que paga.
Fomos eu e a russa que está pelo segundo ano consecutivo aqui e foi bem rápido. Mas o registro não fica pronto na hora, então marcamos de voltar no dia seguinte. Depois disso, ainda precisava fazer o registro na policlínica de Ringwood, então pedi para a deputy me deixar lá (até porque eu não sabia onde que era). A russa aproveitou para ficar em Ringwood também, já que também era o dia de folga dela.
O registro na clinica também foi rápido, acho que é tipo um banco de dados para agilizar o atendimento, se um dia eu precisar. Eu paguei mas 200 Libras para poder usar o sistema de saúde inglês durante esse ano que estarei aqui, mas esse é o tipo de coisa que a gente paga rezando pra nunca precisar usar.
O Henrique e outros voluntários resolveram ir fazer o registro também, então resolvemos esperar eles. Enquanto isso, fomos numa casa de milk shakes ali perto e a russa me deu um milk shake de presente <3
Sentamos num banco, o dia estava ensolarado mas geladinho, e ficamos conversando, esperando o pessoal chegar. Já disse que tô amando o tempo na Inglaterra? <3
Um tempinho depois a cambada apareceu do outro lado da rua e nos juntamos a eles pra ir na policlínica de novo, ajudar caso necessário. Chegando lá, eles estavam sem a carta de apresentação, o que não seria exatamente um problema… Se a mesma moça que me atendeu super rápido não resolvesse implicar com uma assinatura, que ela não me pediu (e que eu também não tinha). Não teve choro nem vela, todo mundo teve que voltar pra trás pra pegar a assinatura (menos eu, claro).
Resolvemos dar uma volta na cidade, um dos meninos queria verificar procedimentos para abrir uma conta no banco, mas logo eles resolveram voltar pra casa por causa da fome. Eu fiquei mais um pouco passeando, aproveitando o dia, vendo lojinhas de cosméticos, hehe… Tem umas coisas interessantes, um mar de água micelar (que tá virando moda entre quem viaja pro exterior) e achei até coletor menstrual na prateleira, o que nunca vi no Brasil (aqui eu vi o mooncup, 21 Libras, ouch!).
No dia seguinte tinha que voltar a Bournemouth pra buscar meu registro na polícia, mas era de tarde, então almocei na casa onde trabalho e fui atrás da mesma deputy que me levou no dia anterior. Fomos conversando no caminho, ela me contando que já tinha ido ao Brasil, o que ela achou, o que fez, etc. Bem legal, mas isso foi há um tempão, muita coisa mudou desde então.
O registro é basicamente uma folha de papelaria preenchida a mão com um contact por cima das informações pessoais, com espaço para carimbos. Toda vez que eu mudar de endereço, tenho que reportar e ganhar mais um carimbo. Traduzindo: algo muito fácil de falsificar! Nem no Japão, onde as pessoas são mais honestas, eu vi algo assim. A moça que me atendeu até me falou pra tomar cuidado pra não perder, porque tem uma máfia que rouba esses certificados para passar para imigrantes ilegais.
Voltei pro camp hill e chamei o Henrique para irmos na cidade postar uma carta e claro que aproveitamos para dar um passeio. Mandar carta não é tão caro e talvez, se o tempo continuar ajudando, eu o faça mais vezes, hehe…
No dia seguinte, tive meu dia de 2h30. Pois é, quando vi na tabela também achei estranho, mas a coordenadora me explicou que era dia de reunião, e só por isso tínhamos essas horas…
A reunião foi longa, mas tranquila, mais sobre a volta as aulas e alguns avisos sobre os alunos, sobre comportamentos e afins. Na semana seguinte é a outra casa do college que tem essa reunião e a gente fica de “plantão” com os alunos deles para que todos participem.
Na sexta seria finalmente a nossa prova de fogo, hora de pôr a mão na massa! Mas… Na noite anterior alguém lembrou que faltava a última parte do nosso treinamento… Argh, bem de manhã!
Lá fomos fazer o tal do Proact-Scip UK, meio que uma aula de defesa pessoal sem que a gente machuque nenhum aluno e sempre mantenha a integridade física de todos. A parte da manhã foi só a teoria, nossa, eu queria morrer de sono na cadeira!
A tarde, teve a parte prática, mas a gente ficou se perguntando até que ponto aquilo ia funcionar na vida real. Provavelmente nada, pelo menos no meu caso. Os alunos mais agressivos são exatamente aqueles que são maiores que eu. Eu no máximo posso sair correndo deles se eles ficarem agressivos, hahaha!
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